Imagem: Fazeres & Saberes
A inversão de valores parece seguir a galope, razão pela qual não podemos perder qualquer oportunidade de trazer o tema e provocar reflexões.
Com efeito, faço referência ao impactante discurso, proferido pelo premiado escritor moçambicano Mia Couto, também biólogo e jornalista, ao receber o título de Doutor Honoris Causa, pela Universidade Politécnica de Maputo, em 2/9/2015, cujo teor foi publicado no site “CONTI outra.”
Em determinado andamento do discurso, ao se dizer honrado quando alguém ainda o chama de professor, Mia Couto traz uma visão, a meu ver lapidar, sobre isso:
“Professor não é quem dá aulas. É quem dá lições. Não é aquele que vai à escola ensinar. É aquele cuja vida é uma escola.”
Mas, a propósito, quero destacar o trecho em que o escritor fala da ‘erosão dos valores morais’, passeando sobre moralidade, bons valores, honestidade… Em face de tudo o que estamos vivenciando atualmente e dos referenciais, cada vez mais valorizados, com ênfase no ter e na ostentação, a contaminar, sobretudo, os mais jovens, vale a pena atentar para os parágrafos que transcrevo a seguir:
…”no fundo, todos sabemos: enriquecer rápido e sem esforço só pode ser feito de uma maneira: roubando, vigarizando, corrompendo e sendo corrompido. Não existe, no mundo, inteiro, uma outra receita.
Preocupa-nos que os nossos estudantes entrem para universidade com fraco desempenho académico. Pois eu acho mais preocupante ainda que os nossos jovens cresçam sem referências morais. Estamos empenhados em assuntos como o empreendedorismo como se todos os nossos filhos estivessem destinados a serem empresários. Ocupamos em cursos de liderança como se a próxima geração fosse toda destinada a criar políticos e líderes. Não vejo muito interesse em preparar os nossos filhos em serem simplesmente boas pessoas, bons cidadãos do seu país, bons cidadãos do mundo.
Escrevi uma vez que a maior desgraça de um país pobre é que, em vez de produzir riqueza, vai produzindo ricos. Poderia hoje acrescentar que outro problema das nações pobres é que, em vez de produzirem conhecimento, produzem doutores (até eu agora já fui promovido..,) . Em vez de promover pesquisa, emitem diplomas. Outra desgraça de uma nação pobre é o modelo único de sucesso que vendem às novas gerações. E esse modelo está bem patente nos vídeo-clips que passam na nossa televisão: um jovem rico e de maus modos, rodeado de carros de luxo e de meninas fáceis, um jovem que pensa que é americano, um jovem que odeia os pobres porque eles lhes fazem lembrar a sua própria origem.
É preciso remar contra toda essa corrente. É preciso mostrar que vale a pena ser honesto. É preciso criar histórias em que o vencedor não é o mais poderoso. Histórias em que quem foi escolhido não foi o mais arrogante mas o mais tolerante, aquele que mais escuta os outros. Histórias em que o herói não é o lambe-botas, nem o chico-esperto.”
A obra de Mia Couto, sempre escrita de forma leve e descomplicada, é sem dúvida marcante. Já fiz algumas referências aqui em outras oportunidades. Suas visões, a meu ver, são claras e trazem propriedade. No geral, instigam reflexão. E isso é o melhor de tudo!
Quem quiser conferir a íntegra do discurso, o que recomendo, clique no link a seguir:
http://www.contioutra.com/o-livro-que-era-uma-casa-a-casa-que-era-um-pais-por-mia-couto/
Excelente !!!
Fantástico! E extremamente aplicável à nossa realidade. Vivemos o mal da humanidade, não apenas um mal do Brasil.
Parabéns
Obrigado pelo comentário, estimado Mardônio. Como sempre, mais do que apropriado!
Abração.
Excelenteesta materia baseada na obra de Mia Couto.Sua obra é um modelo de inspiração para o relacionamento entre os que detém o poder e os que sofrem as consequências do má gestão dos bens da natureza
É, amiga Sandra. O escritor Mia Couto é uma referência. Sou fã!
Obrigado pelo comentário!!!
Abs
É muito importante ir relembrando estes valores, actualmente tão maltratados, para não dizer esquecidos. Mia Couto é uma referência, e este post, uma excelente homenagem.
Por certo, Dulce. O considero um escritor contemporâneo dos mais valorosos!
Grato pelo comentário!