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Divulgo a excelente resenha de Vanessa Pádua, publicada no seu blog Deus Me Tirou Pra Dançar, a respeito do filme Perfect Sense (“Sentidos do Amor”, na versão brasileira), que está no catálogo da Netflix. Como ainda não vi o filme, o que me chamou a atenção mesmo foram as reflexões e os questionamentos trazidos por Vanessa, razão principal deste post.
Vejam com que profundidade, inteligência e, diria, propriedade, a autora da resenha aborda a relação – e o “pouco caso” – da maioria das pessoas com os seus sentidos (ou capacidades) naturais: a audição, a visão, o olfato…
Independentemente do conteúdo que o convidativo filme deve mostrar (fiquei muito curioso para assistir), o texto produzido por Vanessa é acima de tudo instigante. Merece reflexão! Leiam a seguir:
“Perfect Sense – 2010. Dirigido por David Mackenzie
Nossos sentidos são portais? Portais para o quê?
Ora eles nos conduzem a estados de consciência alterados, ora eles nos distraem, nos fazendo perder o bafo mais quente e úmido da vida. Os sentidos podem ser como um mantra nos conduzindo a estados meditativos. Por exemplo, ao colocarmos plena atenção num som da natureza temos a possibilidade de, gradativamente, aquietar nossa mente, e escorregarmos para o salão secreto do nosso inconsciente, ou a integração serena com a natureza (a nossa natureza).
Infelizmente, quase sempre, e ao longo de toda a vida, eles são instrumentos de distração. Usamos nossa audição, por exemplo, para escutar todo tipo de ruído externo, porém, muito pouco para a percepção dos nossos ruídos internos, nossas próprias falas desconexas e desalinhadas, muito pouco para detectar nossas incoerências (Veja, longe de fazer um julgamento sobre a incoerência. Alguns dirão, “Sou incoerente. Não tenho compromisso com a coerência”. Ok. Tudo bem. Mas você sabe identificá-las? Já farejou sobre o teor de suas incoerências? Elas dizem muito sobre você! E se você, na maior parte do tempo, não se sente pleno, sinto dizer, mas é sadio que você as dissolva, para o seu próprio bem.).
O que dizer da visão?! Como ela nos incentiva à grande cilada do julgamento! Vejo, logo julgo.
E por aí vamos… Um sem fim.
O filme Sentidos do amor, toca nessa questão. Narra uma pandemia, onde os humanos vão, gradativamente, perdendo seus sentidos: olfato, paladar, audição e, finalmente, a visão.
Mas perder um, dois, três sentidos, não é suficiente para o despertar em relação ao “piloto automático” que a humanidade vive, porque eis que se apresenta uma outra habilidade humana, também muito mal compreendida, sua capacidade de ADAPTAÇÃO. Uma adaptação muito mais identificada com a acomodação do que com a resiliência. É dizer: perco o olfato, mas… Que diferença faz? O uso que faço dele é tão raso, que não me faz tanta falta. Reservo tão pouco tempo para me deliciar com o perfume que exala do jardim que cruzo semanalmente, da comida que me sirvo diariamente, da pele da pessoa amada que adormece todas as noites ao meu lado.
Logo perco o paladar, e novamente, da perspectiva supérflua de sua apropriação, é questão de tempo para que eu nem me lembre que um dia, remoto, saboreei a rosquinha frita da vovó quando chegava, criança faminta, do clube; que o sabor do primeiro beijo foi um pouco estranho e inesperado; que a água com ervas desceu refrescante e harmônica com o menu servido no almoço.
Em seguida, perdemos a audição. Deixamos de escutar o outro; agora literalmente!
Não sei exatamente quando a “ficha” da humanidade começa a cair, mas nesse ponto do filme (da não escuta), começamos a farejar, de forma mais evidente, onde isso tudo vai dar. E é num lapso de tempo muito curto, entre o não escutar e a espreita da escuridão (perderemos a visão) que nos damos conta de um sentido sutil, imaterial, que me liga ao outro. Um sentido sublime, que pode ser a fusão de todos estes sentidos, potencializados. Nesse limite entre a terra firme e o abismo, experimentamos um Encontro, a totalidade do nosso ser.
Parece que é na falta, no vazio, que reconhecemos o todo que somos.
Os personagens principais do filme, correm desesperadamente, para aquela última chance de um abraço sob a luz da visão – metáfora incrível do nosso mergulho no Todo.
“São os teus braços, dentro dos meus braços. Via Láctea fechando o infinito” – Florbela Espanca
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“Sentidos do Amor” é uma produção britânica, vencedora no Ediburgh Film Festival.
Postado por Vanessa Pádua de Mendonça às 06:03 ”
Creio que esse filme tem o mesmo objetivo do outro; Ensaio sobre a cegueira, que fala da cegueira do homem, com relação aos caos que vem transformando o mundo, o semelhante e a natureza.
Não assisti o filme em questão, mas, pela resenha, creio ser mais, ou menos nesse sentido. Se assim o for, que bom que algumas pessoas estejam preocupados com isso e de alguma forma estejam chamando atenção.
Acho que é bem por aí; pessoas que lidam com publico, devem aproveitar a oportunidade para começar a espalhar essa ideia.
É isso mesmo, Lúcia. É o tipo de reflexão alentadora!